“E mal reconheci o gosto do
pedaço de madalena molhado em chá que minha tia me dava (...), eis que a velha
casa cinzenta, de fachada para a rua, onde estava seu quarto, veio aplicar-se,
como um cenário de teatro, ao pequeno pavilhão que dava para o jardim e que
fora construído para meus pais ao fundo da mesma (...); e, com a casa, a cidade
toda, desde a manhã à noite, por qualquer tempo, a praça para onde me mandavam
antes do almoço, as ruas por onde eu passava e as estradas que seguíamos quando
fazia bom tempo. E, como nesse divertimento japonês de mergulhar numa bacia de
porcelana cheia d’água pedacinhos de papel, até então indistintos e que, depois
de molhados, se estiram, se delineiam, se colorem, se diferenciam, tornam-se
flores, casas, personagens consistentes e reconhecíveis, assim agora todas as
flores do nosso jardim e as do parque do Sr. Swann, e as ninfeias do Vivonne, e
a boa gente da aldeia e suas pequenas moradias e a igreja de Combray e seus
arredores, tudo isso que toma forma e solidez, saiu, cidade e jardim, da minha
taça de chá”.
Extraído de "Em busca do tempo perdido"
Comida e memória: essa talvez seja a mais célebre das páginas da Literatura mundial onde esse binômio se verifica de maneira muito intensa. A capacidade de trazer a memória da infância, dos "bons tempos" como diriam as nossas avós, através do aroma liberado pelo bolinho mergulhado dentro da xícara de chá, evoca, também, recordações das nossas infâncias.
A madeleine nasceu na cidade de Commercy, na região da Lorena, na França. Conta-se que em 1775 Estanislau Leszczynski (1677 - 1766), rei da Polônia e Duque de Lorena, sogro de Luís XV, recebeu para um jantar o filósofo Voltaire e Madame de Châtelet. Durante o jantar ele foi informado que o seu doceiro havia brigado com o cozinheiro e abandonado o seu posto. Preocupado com o fiasco que poderia se tornar aquele jantar, pois uma refeição sem sobremesa era inconcebível, o chef ordenou à jovem ajudante que se encontrava na cozinha de preparar algo enquanto ele entretinha os convidados na sala de jantar. No momento oportuno, foram servidos pequenos bolinhos em formato original, dourados e macios. Assim que foram degustados, o rei imediatamente mandou chamar o autor daquela delícia; e eis que se apresenta a jovem:
- "Como se chama essa obra-prima?"
- "Ela não tem um nome, Senhor; nós a fazemos em nossa casa, aqui em Commercy, para os dias de festa".
- "E qual é o seu nome?"
- "Madeleine, Senhor".
- "Pois bem, chamar-se-á Madeleine de Commercy, como você!"
Receita
65 g de farinha de trigo
65 g de manteiga clarificada
65 g de açúcar
1 ovo e mais uma gema
Em uma tigela bata o ovo e a gema adicional com o açúcar até que a mistura fique clara e espumosa. Adicione a farinha peneirada e mexa com uma espátula, depois junte a manteiga e misture bem. Deixe a massa repousar em local fresco por pelo menos duas horas.
Pré-aqueça o forno a 240 graus, unte enfarinhe uma forma para madeleines, coloque porções de massa em cada uma das cavidades e leve ao forno. Após cinco minutos, diminua temperatura para 200 graus. Assim que estiverem bem douradas, espete um palito e retire do forno. Desenforme-as ainda quentes e polvilhe com açúcar de confeiteiro.