sábado, 30 de outubro de 2010

O Último Baile do Império - 9 de novembro de 1889

Cai o Rei mas não cai a Monarquia”

Essas teriam sido as palavras do Imperador D. Pedro II após tropeçar no desembarque do barco que o levava para a Ilha Fiscal, na noite de 9 para 10 de novembro de 1889, por ocasião do último grande baile do Império.
No livro Esaú e Jacó, o grande Machado de Assis recorda que ao anoitecer os cariocas se dirigiram ao Cais Pharoux, atual Praça XV, para ver “as cesta de lustres no meio da escuridão tranqüila do mar”. Foram distribuídos cerca de 3 mil convites. O baile era uma homenagem do governo imperial à República do Chile. Estava ancorado no porto o encouraçado chileno “Cockrane”, e a grande demonstração visava seu comandante e oficialidade.

Eis a descrição da ilha Fiscal naquela noite festiva. Era de êxtase a impressão que produzia a vista daquele grande foco de luz. Destacava-se na baía a ilha fantástica, iluminada por milhares de luzes e fogos cambiantes, refletindo em vidros de variadíssimas cores, batida constantemente pelos jatos da luz elétrica projetada dos encouraçados “Cockrane”, “Riachuelo” e “Aquidaban”. Da torre do edifício fiscal um poderoso holofote projetava sobre o mar e em terra uma luz da intensidade de 60.000 velas. “Impossível descrever o mágico encanto que ofereciam a ilha, os encouraçados, as lanchas e botes sem conta com fachos iluminativos que coalhavam o mar e cruzavam em todas as direções”. A barca “Ferry”, que conduzia os convidados, estava garbosamente enfeitada e iluminada “a giorno”, o cais Pharoux repleto de povo. Tocava aí a banda de música do Corpo Policial do Rio de Janeiro em grande uniforme. Às 8 1/2 partia a “Primeira”, fazendo depois cinco viagens, e chegando à ilha Fiscal, na última, às 11 1/2. Havia conduzido cerca de quatro mil pessoas, número aumentado pelas que tinham ido em outras embarcações.
SS. MM. Imperiais dirigiram-se para a ilha na barca que partiu às 9 1/2, e SS. AA. a Sra. Condessa e o Sr. Conde d’Eu na seguinte, que deixou o cais pouco depois das 10 horas.
A ilha estava deslumbrante. “Em volta, número avultado de bandeiras chilenas e brasileiras em mastros e hastes, e nas janelas, portas do edifício, terraços, pátio, e dependência, número extraordinário de lanternas venezianas de variadíssimas cores e feitios. Em frente ao cais de desembarque destacava-se um lindo bosque”. Nunca se havia visto festa igual! Dançava-se em seis salas. As duas maiores eram forradas de tapetes encarnados, e estavam ornadas com bandeiras chilenas e brasileiras. As quatro menores estavam mais simplesmente ornadas, mas também com muito gosto. “Nelas havia festões, coroas, âncoras de flores e ornatos”. Todas as portas e janelas tinham preciosíssimas cortinas. A sala reservada à Família Imperial, “e em cujas portas havia amplas cortinas, estava ricamente mobiliada, luxuosamente ornada e profusamente iluminada”. “Havia no interior do edifício bem servido “bufet”. Todo o serviço de iluminação “a giorno” e elétrica foi muito bem feito pela casa Leon Rodde. Era superior a 10.000 o número de lampiões venezianos e copos de cores”. “Era avultadíssimo o número de senhoras, ostentando umas riquíssimas e luxuosas toiletes”. (Indicação de ordem geral que deveria inspirar as particularidades das crônicas futuras). O imperador — não o relata o jornal, mas convidados do festim — passeou durante muito tempo no salão, de um lado para outro, apresentando-lhe nessa ocasião o visconde de Ouro Preto os novos deputados, recentemente reconhecidos. Figurava entre estes, contando 27 anos de idade, o representante do Espírito Santo, Sr. Moniz Freire, que iniciava sua carreira política. Suas Majestades e Altezas retiraram-se pouco depois de meia-noite, “tendo penhorado os nossos hóspedes pela afabilidade e delicadeza com que os trataram”. S. A. o príncipe D. Pedro, que tinha ido com Suas Majestades — jovem e belo, como o mostravam as fotografias — demorou-se ainda algum tempo. “O cardápio era variadíssimo (o decano já não usava a palavra “menu”, preferindo o neologismo de Castro Lopes) e havia em profusão as mais delicadas iguarias”.
Ao servir-se o champagne, o visconde de Ouro Preto, presidente do Conselho, recordou os serviços prestados ao Brasil pelo almirante Cockrane, dirigindo-se depois “em termos os mais afetuosos” ao ministro e oficiais da nação amiga, “levantando um viva à República do Chile”. O comandante Bannem respondeu à saudação, “mostrando-se grato e reconhecido pelas gentilezas dispensadas”. Eram 6 horas da manhã quando se retiraram os últimos convidados da memorável festa, “impossível de descrever com minúcias pela sua invejável grandiosidade”. Foi seu organizador o barão de Sampaio Viana “que depois a entregou ao Sr. Comendador Hasselmann”.
(A República Que a Revolução Destruiu de Sertório de Castro)

No lugar, 150 copeiros trabalhavam sem parar. Quarenta e oito cozinheiros se dedicaram durante três dias seguidos para preparar o banquete. Segundo os jornais da época, enormes toldos abrigavam várias mesas de buffet e, no lado oeste, havia enormes mesas para a ceia enfeitadas com coroas de flores artificiais. O serviço foi feito pela empresa Casa Pascoal. Toda a porcelana usada foi produzida especialmente para a ocasião. Existia um buffet separado para as senhoras e outro exclusivo para a família imperial.
O coquetel tinha sanduíches com foie gras e sorvete de frutas, a grande novidade da época. O anfitrião da festa foi o presidente do Conselho de Ministros, Visconde de Ouro Preto, que propôs um brinde depois que o champanhe foi servido. “Viva o Chile” foram as últimas palavras do discurso. Depois, o jantar foi servido. Entre os pratos, badejo e bijupirá com purê, perdiz com licor e língua de boi. Jacutingas (ave da Mata Atlântica muito usada na culinária da época), pombo selvagem e peru recheado com castanhas e presunto também foram oferecidos. Os doces do último banquete também foram feitos para agradar ao monarca. Eram europeus com toques brasileiros. Foram servidas frutas e castanhas açucaradas, bombons, manjares, creme de chocolate e frutas cobertas com fondant.

A República foi proclamada seis dias depois do baile, e o imperador embarcou para o exílio no mesmo Cais Pharoux de onde partiam os ferry-boats para levar os convidados para o baile.

4 comentários:

  1. Oi amigo! Mais uma vez, peço-lhes desculpas pela confusão da chegada.

    Escrevo-lhe este para lhe contar que eu e o Ralf vimos ao vivo e a cores o quadro com a lagosta que ilustra o cabeçalho do seu blog!

    Foi na exposição Tesouros de Budapeste que estava em cartaz na Royal Academy em Londres. Maravilhoso!

    Aqui está o link de uma matéria e video da exposição: http://www.telegraph.co.uk/culture/art/art-reviews/8023274/Treasures-from-Budapest-at-Royal-Academy.html

    Lembramos muito de você! Bjs

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  2. Estou acompanhando seu blog agora...informações valiosissimas. Pena q o mundo não dá tanto valor para a cultura.Amei de coração!

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  3. Este comentário foi removido pelo autor.

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  4. Este blog ainda está ativo? Gostaria de saber se existe alguma documentação fotográfica do último baile do império na ilha fiscal.
    Cordialmente,
    Carlos Alencar

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