sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

Em nome da rosa

Há pessoas que choram por saber que as rosas têm espinho, há outras que sorriem por saber que os espinhos têm rosas!
                                                                                                                                    Machado de Assis

O nome vem do latim rosa e do grego rhodon. As rosas estão entre as flores mais antigas a serem cultivadas. A primeira parece ter crescido nos jardins asiáticos há 5000 anos. Na sua forma selvagem a flor é ainda mais antiga; fósseis dessas rosas datam de há 35 milhões de anos. Muitas variedades de rosas foram perdidas durante a queda do império romano e a invasão muçulmana da Europa. Após a conquista da Pérsia no século sete, os muçulmanos desenvolveram o gosto pelas rosas, e à medida que seu império se estendia da Índia à Espanha, muitas variedades de rosas foram novamente introduzidas na Europa. Durante a Idade Média, as rosas eram muito cultivadas nos mosteiros. Era regra que pelo menos um monge fosse especialista em botânica e estivesse familiarizado com as virtudes medicinais da rosa e de flores em geral. Hoje as rosas, principalmente as vermelhas, são o símbolo do amor. Não há quem resista a uma dúzia de rosas vermelhas. Shakespeare, em Romeu e Julieta, com uma única frase definiu bem aquilo que sentimos por esta flor: "Aquilo que chamamos rosa, com outro nome seria igualmente doce".


Rosas comestíveis
As pétalas de rosa há muito que são usadas em infusões e conservas. Agora são ingredientes de eleição para sobremesas e conferem um sabor suave e muito agradável a pratos fritos, como a tempura de pétalas de rosas, uma entrada deliciosa e rica em vitaminas. É bom lembrar que as flores comestíveis não são as mesmas compradas na floricultura, mas sim aquelas cultivadas por produtores especializados, sem uso de agrotóxico ou outros tratamentos químicos que possam prejudicar a saúde humana.

Água de Rosas
A água de rosas, conhecida em árabe como Maward e em turco como Gül suyu, é produzida pelos árabes desde o século IX. Embora a técnica usada até hoje seja árabe, a criação do produto parece ter ocorrido na Índia. Pesquisadores acreditam, aliás, que possa ter surgido ao mesmo tempo na Bulgária, na Índia e no mundo árabe. Primeiro surgiu a água, depois o óleo de rosas. O óleo só começou a ser produzido no século XVI, quando se criou a técnica da dupla destilação. O processo de produção é este: as rosas são postas em alambiques de cobre com água - a relação é de 50 litros do líquido para 10000 rosas. Após seis horas de aquecimento, o vapor destilado é resfriado e recolhido, o que resulta em água, óleo e substâncias hidrossolúveis. A flor mais usada é a rosa-de-damasco (Rosa x damascena Mill). Ela é muito perfumada, mas o conteúdo de óleo essencial em suas pétalas é ínfimo, por volta de 1%. Pode-se conseguir maior volume de óleo destilando a água de rosas uma segunda vez. O produto entra na culinária, na indústria de cosméticos e em rituais religiosos hindus. É usada na cozinha do sul e do oeste da Ásia, do Oriente Médio e de parte da Europa. No Irã, entra também em doces, chás, sorvetes e biscoitos. No mundo árabe e na Índia, é usada ainda para aromatizar leite e pratos de leite, como pudim de arroz; ou bebidas como o lassi, feita de iogurte batido com açúcar e frutas. A água de rosas combina com leite, damasco, nozes e frutas e pode compor receitas tanto de sorvete, quanto de musse e coquetéis. Mas pratos salgados como o risoto de rosas podem ter o reforço de sua fragrância.


A história de sucesso de uma das maiores pâtisseries francesas remonta a 1886, com a abertura da primeira loja em Paris, na Place de la Madeleine. Mais alguns anos e Auguste Fauchon, abriria neste mesmo endereço, sua primeira padaria (em 1895). Três anos mais tarde, e o Grand Salon de Thé já era um ponto apreciado por nobres de toda a Europa. O lado empreendedor e inovador do normando Auguste Félix Fauchon mais uma vez lhe ajudou quando, em 1952, ele teve a idéia de fazer uma parceria com a Air France, para comercializar produtos importados. Na época, após o término da Segunda Guerra Mundial, a economia vivia bons momentos, especialmente com o boom no consumo de produtos de luxo. E assim, os parisienses começaram a comprar morangos para as festas de Natal, cerejas chilenas, além dos primeiros kiwis e abacates importados. É um ícone mundial da gastronomia de luxo. Um chá dessas rosas é delicioso e confortante.

Risoto de rosas de Gabriele D´Annunzio
……il sole genera le rose
presso le soglie e intorno alle fontane,
lungo le siepi e su per le finestre….
 (G.D’Annunzio)

O poeta italiano Gabriele D’Annunzio (1863 – 1938) amava tanto as rosas quanto amava as mulheres. De fato, ambas são citadas continuamente em suas obras, entre recônditos significados e alusões misteriosas. No Vittoriale, a residência do poeta às margens do Lago de Garda, norte da Itália, onde viveu os seus últimos anos, D´Annunzio exigia rosas por todos os cantos, do jardim até as estampas dos móveis. Rosas como bibelôs, e rosas na cozinha.
D´Annunzio é conhecido como o maior representante do movimento literário do Decadentismo, foi amigo do compositor francês Claude Debussy (1862 – 1918), foi deputado por três anos e também presidente da Real Academia Italiana. Politicamente, participou de manifestações nacionalistas em favor da Itália fascista durante a I Guerra Mundial. Defendeu a política expansionista de Mussolini e aplaudiu a invasão da Etiópia pelas tropas italianas. Sobrevoou a cidade italiana de Fiume, espalhando panfletos e favorecendo a retirada das tropas aliadas americanas, britânicas e francesas que ocupavam o local. Faleceu vítima de um acidente vascular cerebral e teve um funeral de Estado, graças à sua amizade com o Duce.
A receita do presente risotto alegrou as noitadas do poeta na época do seu romance com a grande atriz italiana Eleonora Duse (1858 – 1924), o grande amor de sua vida e para quem dedicou quatro peças teatrais. Deliciosamente “belle époque”, o prato recorda as sedas orientais e os magníficos jantares que o poeta oferecia à amada, em suntuosas mesas decoradas com muitas rosas e regados por muito champagne rosé.

Ingredientes para duas pessoas:

150 g de arroz arborio
2 botões de rosa
40 g de manteiga
40 g de queijo emental ralado
150 g de creme de leite
1 colher de sobremesa de mel
1 pitada de noz moscada
pimenta branca em pó e sal a gosto
1 colher de chá de água de rosas
1 cálice de vinho rosé
1 l de caldo de legumes para cozinhar o arroz

Modo de preparar:
Despetale as rosas e tire aquela parte branca de sua parte inferior, onde ficam presas à corola e mergulhe a metade delas numa panela, depois de bem lavadas e secas, em metade da manteiga. Adicione o arroz, o sal, a noz moscada e a pimenta branca. Assim que o arroz estiver envolvido na manteiga, adicione o vinho rose e metade do caldo. Deixe cozinhar, mexendo constantemente. Vá adicionando o caldo sempre que o risoto estiver ficando seco demais. Assim que estiver bem cozido, adicione o restante das pétalas de rosa, o resto da manteiga, o mel, e misture energicamente para que todos os ingredientes se incorporem bem. Finalize adicionando o queijo ralado e a água de rosas.

Do livro Fama à mesa, Editora Tinta Negra, 2010

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